Pesquisadores nacionais e internacionais participaram de uma expedição no Pantanal mato-grossense para estudar como os efeitos da seca e dos incêndios nos últimos anos afetam a biodiversidade local. Entre eles está a professora do curso de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Rondonópolis (UFR), Simoni Maria Loverde-Oliveira, que desenvolve pesquisas na instituição na área de ecologia aplicada à conservação dos recursos hídricos, ecologia de microalgas e educação ambiental. Ela participa do projeto desde 2017, analisando o impacto das cinzas dos incêndios nos microrganismos aquáticos dos rios e baías do Pantanal.
A ação está ligada a um projeto ecológico de longa duração que avalia as dinâmicas ecológicas na planície de inundação do Rio Paraguai (Peld-Darp). O projeto é coordenado pela pesquisadora Carolina Joana, bióloga e professora da Universidade Estadual de Mato Grosso (UNEMAT). Em entrevista para o Jornal Hoje, Joana explica que o projeto permite o estudo do passado, do presente, e da possibilidade de se pensar o futuro dos filhos e netos da próxima geração a partir do conceito de sustentabilidade.
A expedição partiu de Cáceres até a reserva ecológica do Taimã, no Parque Nacional do Pantanal, levando pesquisadores brasileiros e estrangeiros, ativistas e membros de ONGs em uma chalana que navegou durante uma semana pelos rios Paraguai e Cuiabá. Durante o percurso foram recolhidas amostras em 28 pontos com o auxílio de redes especiais cujo tamanho dos poros permitiu a seleção de diferentes microrganismos presentes na água.
Essas amostras foram acondicionadas em frascos identificados e preservadas com reagente químicos para serem estudadas em laboratório, onde são submetidas à análise para identificação de parâmetros como transparência, disponibilidade de oxigênio, grau de acidez ou alcalinidade (PH), presença de nutrientes, entre outros indicadores que demonstram a qualidade da água.
Laboratório de Análises Hídricas e Ecologia Aplicada (LAHEA) da UFR
Parte das amostras são analisadas em laboratório da UFR
Na UFR, as amostras coletadas são investigadas no Laboratório de Análises Hídricas e Ecologia Aplicada (LAHEA), que tem por finalidade o monitoramento dos parâmetros da água e a realização de projetos de pesquisa ambiental, estudos das águas continentais, ecologia de organismos e peixes, além de ações de divulgação científica e educação ambiental.
A professora Simoni, explica que os microrganismos são os melhores indicadores para apontar a variação da qualidade da água, pois eles impactam em toda cadeia ecológica, uma vez que todos os organismos estão de alguma forma interligados. Ela explica que já foram realizados experimentos científicos que mostraram que conforme as cinzas das queimadas vão para dentro da água, estes microrganismos interrompem seus processos de respiração, não reproduzem, os ovos não eclodem, e eles acabam por fim morrendo.
“[Os microrganismos] são a base da cadeia alimentar […]. Então quanto mais a gente tiver deles é possível que você alimente uma cadeia com mais peixes pequenininhos, que alimentam outros, até os grandes peixes. […] Essas cinzas interferem na sobrevivência desses microrganismos que são a base da produtividade aquática desses sistemas […]”, esclarece a professora.
Simoni cita como exemplo as algas microscópicas, com papel fundamental nos processos de fotossíntese ao liberarem oxigênio na água, o que impacta diretamente na produtividade aquática e na alimentação de peixes que estão na base da cadeia alimentar. Como essas algas precisam da luz solar para realizar a fotossíntese, fatores como a turbidez da água interferem no processo. A professora ainda aponta que as cinzas das queimadas também afetam as comunidades biológicas, fonte de alimentos de peixes e plantas, levando a perda de habitat para reprodução das diferentes espécies de vida.
Pesquisadoras de diferentes instituições participam do projeto de longa duração
Pesquisadores firmam pacto pela restauração do Pantanal
Para além da contribuição científica, os membros da expedição trabalham ativamente pela restauração das áreas degradadas pelos incêndios e pela variação de seca extrema, participando de um pacto pela restauração do Pantanal que tem como objetivo articular governos, ONGs, comunidades locais e o setor privado em ações de restauração ecológica e conservação. Entre as ações do pacto estão a criação de bases científicas para a restauração dos ecossistemas, iniciativas coletivas de ação, monitoramento do progresso das áreas degradadas, e o desenvolvimento de protocolos e ferramentas para integrar dados e incentivar a restauração.
As pesquisas do projeto Peld-Darp continuam ativas e devem apresentar mais resultados em breve. A iniciativa é financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Inovação (Seciteci), Fundação de Amparo à Pesquisa (Fapemat) e Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).