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Haddad, Tebet e Campos Neto debatem taxa de juros e ajuste fiscal

A atual taxa básica de juros (Selic) em 13,75%, a capacidade de crescimento do país, expectativas inflacionárias e novo arcabouço fiscal são alguns dos temas predominantes na sessão de debates no Plenário do Senado, que conta com a presença do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, da ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, além de economistas e representantes do setor produtivo. A sessão desta quinta-feira (27) foi requerida pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco. 

Apesar de reconhecer a preocupação com o controle da taxa de juros para manter a inflação próximo à meta, fixada atualmente em 3%, Pacheco falou sobre a importância de se refletir sobre o cenário de uma taxa Selic, que é o principal instrumento de política monetária do Banco Central, causar efeito severo sobre o desempenho da economia.

— Se a contração do crédito por parte da população e das empresas é impactada pela variação da taxa Selic, é simples perceber que uma taxa de juros alta prejudica o consumo e o crescimento econômico, configurando entrave ao desenvolvimento nacional, à erradicação da pobreza e da marginalização, e à redução das desigualdades sociais e regionais, objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, como figuram no art. 3º de nossa Constituição. Ao mesmo tempo em que não é viável o aumento descontrolado de preços, também não se deseja o estrangulamento da economia no curto prazo — disse Pacheco. 

Gastos tributários

Ao avaliar o quadro macroeconômico, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, lembrou que a política monetária, implementada pelo Banco Central, e a política fiscal, pelo governo federal, precisam ser integradas.

— O trabalho tem que ser a muitas mãos, um reforçando o trabalho do outro, o monetário fortalecendo o trabalho do fiscal, o fiscal, do monetário, e também o prudencial, porque nós estamos com vários setores da economia drasticamente afetados.

Diante do Orçamento aprovado no ano passado, que levava à descontinuidade dos programas sociais e à incapacidade investimento público, o ministro observou que era preciso tomar medidas saneadoras para recuperar as finanças públicas.

— Para onde olhar? Qual é a maneira correta de fazer o ajuste sem penalizar aqueles que dependem do SUS, da escola pública, da universidade pública, da segurança pública, da assistência social e assim sucessivamente? A maneira que nós escolhemos de fazer o ajuste foi abrindo a caixa-preta das renúncias fiscais, o chamado gasto tributário. (…) Estamos falando em torno de R$ 500 bilhões explícitos na peça orçamentária e seus respectivos anexos de renúncia fiscal e outros R$ 100 bilhões que não estão na Lei Orçamentária, porque são tributos que sequer são considerados para fins fiscais em virtude da frouxidão da nossa legislação, com práticas inadequadas e inaceitáveis no mundo desenvolvido. Então há de se falar em contra de gastos na nossa opinião? Sim. Sobretudo o gasto tributário — disse.

Haddad apontou o novo arcabouço fiscal encaminhado ao Congresso e a reforma tributária como prioridades para fazer avançar uma agenda voltada para o desenvolvimento sustentável. Ele observou que as renúncias fiscais, muitas delas antigas e sem relevância social e econômica, representam R$ 500 bilhões a menos no Orçamento — quatro vezes o gasto com o maior programa de transferência de renda do mundo, o Bolsa Família.

— Temos aí uma agenda importante de recuperação da nossa capacidade de crescer, gerar emprego, gerar renda, gerar desenvolvimento. Eu sou da opinião de que os conflitos distributivos no Brasil [do ponto de vista social] são tão severos que eles só se equacionam com o crescimento. Crescendo uma média de 1% ao ano, 1,5% ao ano, se nós fomos levar em consideração que o crescimento da renda per capita é sistematicamente inferior a 1% ao ano, nós não vamos resolver os problemas sociais e as necessidades imperiosas de investimento na nossa matriz produtiva, que está muito defasada tanto no ponto de vista tecnológico quanto do ponto de vista de infraestrutura — explicou Haddad, lembrando que não se pode penalizar trabalhadores e empresários, que geram renda, enquanto se perpetua um quadro de injustiça tributária, que impede o crescimento e dificulta a concorrência. O ministro ainda sublinhou que no ano passado foram gastos extraordinariamente R$ 300 bilhões dos quais o país não dispunha para tentar reverter um quadro eleitoral desfavorável ao governo anterior.

A ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, salientou que “juros, inflação e crescimento” precisam andar juntos, salientando que “o crescimento não pode ficar no meio do caminho”.

— Não há contradição  (…) quando nós dissemos que, sim, o Banco Central é responsável pela política monetária, que tem sempre decisões técnicas, mas também é preciso afirmar que tem que sempre ter foco nas políticas públicas e no crescimento do Brasil. Não há contradição em dizer: o Banco Central é autônomo, e é bom que seja; a autonomia do Banco Central é importante para a estabilidade econômica. Portanto, o governo não interfere nas decisões técnicas do Banco Central, mas o Banco Central também não pode considerar que as suas ações são apenas técnicas; são técnicas, mas também são decisões que interferem na política, especialmente os seus comunicados e as suas atas — afirmou Tebet.

Inflação

O presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, disse entender que a inflação atinge de forma perversa as classes mais pobres da sociedade e que a instituição tem atuado de forma técnica, com um corpo de profissionais capacitado para buscar a estabilidade tanto de preços e do sistema financeiro “sempre com o menor custo de vida” para a sociedade. Ele afirmou que a entidade compreende a defesa do governo de buscar o crescimento econômico priorizando a agenda social, mas frisou que ela depende do controle inflacionário. 

Roberto Campos Neto ressaltou que o BC tem “um horizonte de metas um pouco distante do horizonte da política”, justificando assim a autonomia concedida ao presidente. Sobre o questionamento quanto à taxa de juros num índice elevado, o presidente do BC argumentou que a entidade se baseia na percepção de risco, piora na expectativa de inflação tanto pelo mercado como pelo próprio BC e na alta proporção de crédito direcionado a grupos específicos. Ele explicou que para definir a taxa de juros o BC considera a inflação, a capacidade de crescimento do país e as expectativas inflacionárias.

— Se eu caio os juros sem credibilidade, eu caio os juros curtos e, às vezes, o longo até cai por um tempo, mas dura muito pouco, porque ele volta a subir, porque tem um tema de credibilidade. E o que importa na economia não é a Selic, o que importa é o que a gente chama de condições financeiras, que é o que eu tenho total de liquidez na economia, e a Selic é um instrumento que, para gerar condições de liquidez, tem que ser conduzida com credibilidade — disse o presidente do Banco Central.

O economista Armínio Fraga, que foi presidente do BC durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, disse considerar positivo o esforço da equipe econômica do governo Lula no sentido de buscar um ajuste fiscal, enfrentando forças políticas contrárias. Para ele, porém, o ajuste não pode se limitar à relação dívida pública e PIB, à solvência do Estado. No seu entendimento, o ajuste precisa ser mais severo, de mais longo prazo, tocando numa reforma administrativa e previdenciária.

— Isso está no manual político mais clássico do planeta, que é O Príncipe, de Maquiavel: as coisas mais complicadas a gente faz logo e depois usufrui dos resultados — disse Fraga, argumentando que quase 80% dos gastos públicos vão para a folha de pagamentos e a Previdência.

Representantes do setor produtivo, por sua vez, apontaram o quadro de estagnação econômica, segundo eles em grande parte provocada pela política monetária, que segue a apostar em juros altos. O presidente da Confederação Nacional da Indústria, Robson Braga de Andrade, negou que o Brasil viva um quadro de inflação de demanda, opondo-se à visão de Roberto Campos Neto.

— Porque as nossas empresas, presidente Roberto Campos, nós estamos sofrendo muito com uma demanda fraca. Nós estamos vendo aí setores que têm passado por diversas dificuldades. No setor automobilístico, recentemente, férias coletivas, desemprego, diversos setores que têm realmente enfrentado dificuldades porque não têm a demanda necessária — disse Andrade.